Precisamos dar um sentido humano às nossas construções. E, quando o amor ao dinheiro e ao sucesso nos estiver deixando cegos, saibamos fazer pausas para olhar os lírios do campo e as aves do céu. (Erico Verissimo)
Resumo do artigo
Os pássaros silvestres são excelentes indicadores da qualidade de vida no meio ambiente. A sociedade contemporânea tem afetado o equilíbrio ecológico através de ações predatórias com objetivos econômicos. A efetividade da legislação não alcança resultados satisfatórios, tanto pela ineficiência dos órgãos controladores como pelo comportamento da população diante da natureza. O objetivo deste trabalho é avaliar as práticas oficiais e da sociedade diante dos recursos naturais e da preservação das aves silvestres. A metodologia é pesquisa bibliográfica com apoio nas experiências de saídas de campo para registro de pássaros em reservas ambientais no Brasil.
Introdução
A legislação contemporânea oferece instrumentos jurídicos de proteção aos animais domésticos, silvestres ou exóticos. A efetividade de tais leis está longe de ser considerada satisfatória, pois os problemas que surgem no cotidiano revelam práticas cruéis como uso em laboratórios de pesquisa, trabalho excessivo, posse irresponsável, caça ou tráfico.
A distância entre a legislação e as práticas sociais, referentes aos animais, é um abismo profundo que, mesmo com a evolução efetivada nos últimos tempos, estes seres indefesos continuam em situação deplorável. O bem-estar usufruído pelos humanos em decorrência dos avanços econômicos e tecnológicos não tem correspondido a uma melhora de vida para os animais. A consciência de que o homem não está só no universo, mas que apenas é um de seus componentes reduz o seu protagonismo e, consequentemente, o mundo jurídico abre espaço para a tutela dos outros seres parceiros do homem no universo.
Na contemporaneidade, o desenvolvimento econômico determina grandes prejuízos ao meio ambiente, não só pela poluição ambiental, mas, em especial, pela exploração predatória dos recursos naturais e a consequente extinção de muitas espécies de aves.
A preocupação com esta situação caótica exige medidas que possam limitar a atuação do homem e buscar o equilíbrio ecológico. Tanto a Constituição de 1988, como a legislação infraconstitucional são direcionadas para a proteção do meio ambiente e, consequentemente, para a tutela do direito fundamental de viver num ambiente sadio e equilibrado.
Assim, toma importância o estudo da legislação penal que determina a responsabilidade pelos crimes contra o meio ambiente. Neste enfoque, o presente trabalho aborda a proteção às aves no Brasil, através da pesquisa bibliográfica e da exemplificação de alguns casos representativos.
Vivemos um momento em que a impunidade tem sido a regra em todos os setores e, por consequência, o meio ambiente sofre pela ambição desenfreada, pelo lucro e pelo uso irresponsável dos recursos naturais. Assim, torna-se imperioso o repensar da legislação e das práticas que regem a conduta dos entes públicos e privados diante do dever de preservação da natureza. A partir da Constituição Federal e demais leis ambientais é fundamental avaliar as formas de responsabilização nas ações danosas à natureza. Por outro lado, antes e além de pensar nas penalidades é importante destacar ações e projetos que, muitas vezes, de forma silenciosa, contribuem para a recomposição do meio ambiente.
Os mecanismos de controle e autuação na área ambiental são oriundos de esferas administrativas distintas ( CF/88, artigos 21 a 24), o que, em determinadas situações, cria conflitos de competência, que prejudicam a proteçâo a fauna e à flora. A efetividade do controle e a penalização dos danos são precários e insuficientes para deter o avanço da atividade predatória.
O percurso do texto inicia pela afirmativa do direito dos animais humanos e não humanos, buscando romper com a visão antropocêntrica para contrapor com uma nova postura frente aos animais. Ao assumir esta opção, ressalta-se a importância de "As aves e o ecossistema" como fundamento para o exame da situação atual dos estudos do Direito Ambiental. Para efetivar aderência aos estudos jurídicos, o texto segue com dois estudos teóricos: Competências e responsabilidades que antecipam a exposição final sobre a transformação por que passa o Direito Ambiental ao estabelecer novo olhar sobre A efetividade da tutela ambiental.
Este é um caminho que almeja levar à reflexão sobre a necessidade de buscar uma nova visão sobre o convívio do homem com a natureza. Neste contexto, as aves são nosso foco principal, pois merecem toda a admiração tanto pela beleza, quanto pela capacidade de resistir a tantas agressões que a sociedade contemporânea lhes infringe.
Direitos dos animais humanos e não humanos
As ameaças ao meio ambiente decorrem de diversos fatores contemporâneos, principalmente os causados pelas dificuldades econômicas que geram conflitos sociais. A destruição do meio ambiente pode levar a humanidade a um "mundo artificial [i]" no qual as consequências serão devastadoras não só para a natureza, mas também para o próprio homem. A irresponsabilidade dos homens do presente condena as gerações futuras a conviverem num caos destituído de referências. Uma reflexão importante, mas que, muitas vezes, não aflora nas discussões acadêmicas é o custo econômico que o desrespeito com o meio ambiente causa na economia do Brasil.
A evolução da concepção de Direitos Humanos, estendendo o conceito muito além do princípio fundamental de preservação da vida, atinge, na contemporaneidade, uma visão mais ampla, incluindo a natureza, não só como um bem a ser preservado, mas também como elemento detentor de direitos. A doutrina jurídica prevê os direitos fundamentados em três dimensões.
Não se pode falar em uma situação legal reconhecida em determinado momento, mas a recepção dos direitos fundamentais é resultante de uma construção ao longo do tempo. O que se percebe é que esta progressão inicia com o reconhecimento ao direito à vida, à liberdade e à participação no processo democrático da sociedade, este pode ser considerado como a primeira dimensão. Na segunda dimensão incluem-se os direitos sociais, econômicos e culturais
Dentre os direitos de terceira dimensão incluem-se a paz, a qualidade de vida e o meio ambiente equilibrado. Quanto à titularidade, os direitos de terceira dimensão são particularmente coletivos, o que não afeta a possibilidade do exercício, por parte do cidadão, pelo caráter de proteção à vida e à dignidade humana.
"De outra parte, observa-se que, nada obstante a já relevada dimensão coletiva e difusa de parte dos novos direitos da terceira (e da quarta?) dimensão, resta, de regra, preservado seu cunho individual. Objeto último, em todos os casos referidos, é sempre a proteção da vida, da liberdade, da igualdade e da dignidade da pessoa humana, o que pode ser bem exemplificado pelo direito ao meio ambiente.". (SARLET: 2009) [ii]
O direto de proteção ao meio ambiente não encontra abrigo no capítulo dos direitos fundamentais ( CF/ 88 - Título II, os Direitos e Garantias Fundamentais), mas, assim como outros, surge em espaços especiais como nos artigos 4º, 196 e 225 da CF/88. Além destes textos legais, acrescente-se o artigo 203, CF/88 que estende a assistência social a todo indivíduo que dela necessitar. Este é um exemplo claro da possibilidade do exercício individual no Direito Ambiental, contrariando seu caráter coletivo, vai à busca por reparação de dano sofrido pelo indivíduo em decorrência de agressão ao meio ambiente.
A construção doutrinária da extensão dos direitos fundamentais aos entes animais não humanos é bastante recente e tem suscitado acalorados debates, principalmente quanto à titularidade. Visível o posicionamento da legislação brasileira como sendo antropocêntrica, estabelecendo a prevalência dos direitos dos animais humanos sobre os não humanos. Este posicionamento, consolidado ao longo do tempo, ignora as relações de interdependência existentes entre os seres viventes. Uma visão ecológica, que respeite o equilíbrio do ecossistema não pode enquadrar-se num contexto de desrespeito aos animais.
De forma lapidar, o professor Ingo Sarlet estabelece a conexão entre os direitos dos animais humanos e não humanos ao conceituar o que se considera dignidade humana:
"a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida". (SARLET. 2012. p. 192.)
O que se percebe é que a doutrina tem fundamentado importantes transformações na prática jurídica, influindo com vigor em decisões dos tribunais, proporcionando a efetividade do direito dos animais mesmo diante de textos legais apontando em sentido contrário. O direito animal não surge diretamente da letra da lei, mas da observação de princípios fundamentais que são extensivos aos animais. Não se ignora a capacidade dos animais de, em maior ou menor grau, possuírem sensibilidade que vai além das sensações físicas (frio ou fome), o que se designa como sendo "senciência".
A consciência de que o animal não humano tem capacidade de percepção do sofrimento e a capacidade de externar sentimentos é que fundamenta a titularidade de direito para eles, pois, tendo capacidade de percepção, é mister que recebam proteção. O Direito é dinâmico e, como afirma a professora Fernanda Medeiros: "direito é decorrente das transformações sociais e de suas demandas e as normas jurídicas são fruto da necessidade do Estado regular em conformidade com essas novas demandas da sociedade". [iii]
De forma gradual, os tribunais caminham para o reconhecimento dos direitos dos animais, conforme se percebe em algumas decisões recentes. Um exemplo é a decisão do STF [iv] ao julgar o caso da "Farra do Boi", evento tradicional em Santa Catarina, é taxativo no sentido de que o bem-estar animal é prevalente sobre interesses econômicos e turísticos de grupos e práticas culturais.
O direito ao meio ambiente saudável conforme expresso no art. 225 CF/88, constitui-se num direito-dever, pois o texto constitucional atribui a todos a obrigação de preservar o meio ambiente como valor social a ser garantido às futuras gerações. Esta garantia só será efetivada, na medida em que abandonarmos a posição antropocêntrica, para reconhecermos que o universo é único e todos os partícipes são titulares de direitos e deveres.
Os deveres fundamentais podem ser classificados, quanto à aplicação, como sendo "defensivos" quando se estabelece limites, principalmente, ao Estado ou "prestacionais" quando se exige a ação do estado para a obtenção do direito pretendido. O sentido de defensivo, em relação aos animais, configura-se, especialmente, na exigência de respeito e proteção, exigindo-se limites ao seu emprego no serviço ou diversão. Há que se impor limites nas ações humanas de forma a não desrespeitar o direito dos animais em relação à saúde, alimentação e dignidade. Por outro lado, é obrigatória a prestação de assistência aos animais, em termos de cuidados médico-veterinário, controle de doenças e manutenção das fontes de alimento.
A dignidade da pessoa humana é o alicerce de toda cadeia de Direitos Fundamentais. Há, porém, que se considerar que não é um direito positivado, mas um princípio axiológico que se centra em fatores éticos, filosóficos, históricos e ecológicos. A perspectiva ecológica do princípio da dignidade da pessoa humana está intimamente relacionada com a construção de um ambiente que respeite o ecossistema, construindo o sentido grego de "oikós". [v]
Esta visão mais ampla de meio ambiente é que justifica o sentido de interdependência entre todos os elementos presentes no planeta. As aves, por serem excelentes indicadores da qualidade de vida de um determinado ambiente, são elementos de fácil controle e acompanhamento para estudiosos do ecossistema. Por outro lado, elas são objeto de interesse para todos que apreciam a natureza, principalmente fotógrafos e "birdwaching".
Aves e o Ecossistema
As aves são fundamentais para o equilíbrio do ecossistema, pois elas interagem com a vegetação e têm como fonte de alimento alguns insetos e pequenos animais que tornariam desequilibrado o meio ambiente se não houvesse o controle populacional desenvolvido por elas. As regiões próximas aos cursos d'água e com vegetação preservada são as que apresentam maior concentração de aves, pois estes são recursos indispensáveis para sua sobrevivência.
Esta dinâmica entre aves, recursos hídricos e matas nativas é que justifica a necessidade de proteção e criação de ambientes propícios ao habitat e procriação da avifauna. Fundamental perceber que a preservação destes ambientes não favorece apenas às aves, mas a toda a fauna local e diretamente ao homem, um partícipe do ecossistema.
De toda água no planeta, 97% é salgada, compondo oceanos e mares; 2,25% está nas calotas polares e geleiras e apenas 0,72% constitui os rios, lagos e outros ambientes de água doce [vi]. É esta pequena porção que o homem utiliza para suas necessidades e partilha com a flora e a fauna. A poluição das águas é um dos principais fatores de desequilíbrio ecológico, pois afeta suas características físico-biológicas.
A política de preservação dos recursos hídricos tem fundamental função na preservação da flora e da fauna. As aves têm seu sustento nos recursos hídricos e, algumas fazem das águas seu habitat. O martim pescador (cloroceryle americana) e a águia pescadora (Pandion haliaetus) têm nos rios e lagos a sua fonte de alimento. Pato-do-mato (Cairina moschata) e marreca colhereira (Anas platalea) têm nos lagos, rios e pântanos, além de alimento, seu refúgio. O gavião caramujeiro (Rostrhamus sociabilis) depende dos locais alagadiços para alimentar-se.
A preservação das matas nativas é um imperativo para que todo o ecossistema funcione. As matas, além de servirem de refúgio para a fauna, são guardiãs das fontes de água e dos cursos dos rios. A mata ciliar preserva as margens dos rios e torna-se um corredor de integração para as aves.
Não se pode conceber a preservação de florestas como áreas isoladas como no caso de replantio de zonas fracionadas, pois, para que a mata tenha a sua funcionalidade preservada, é necessário que seu território seja contínuo por grandes espaços, pois os animais circulam pelo seu interior por muitos quilômetros. Na fauna, há espécies que não atravessam espaços sem vegetação, por isso, reduzir a mata é reduzir seu espaço e condená-los ao isolamento, o que pode levar à degeneração da espécie ou mesmo a sua extinção.
Desnecessário dizer que as árvores são elementos reguladores dos ciclos de chuva e, portanto, da oferta de água para uma determinada região. As matas ciliares são a proteção dos rios e lagos, evitando a erosão e estabelecendo a conexão floresta/água para manutenção do habitat da fauna. Neste sentido é fundamental a regulamentação da faixa de mata preservada nas propriedades agrícolas. Como prevê o Novo Código Florestal no seu artigo 4º estabelece limites de proteção para as matas ao longo de cursos d'água.
O descaso com as matas ciliares é o principal fator de transbordamento dos rios em períodos de chuvas intensas, pois um rio assoreado é uma calha rasa que expulsa as águas em direção às cidades e povoados. Se, em um momento o agronegócio imagina que o aproveitamento da terra até a margem do rio é um lucro, o que resta depois é a destruição da própria lavoura e os grandes prejuízos nas áreas urbanas.
Um ambiente em equilíbrio propicia às aves desenvolverem as suas maiores contribuições para a preservação e expansão das florestas. A contribuição delas ocorre através de dois processos importantes: a polinização das flores e a dispersão das sementes e pólen.
Não só as aves desempenham o papel de polinizadores (Ornitofilia), muitos outros animais, ou mesmo o vento são vetores de polinização e exercem esta função, dando origem a uma classificação das flores, conforme o agente polinizador [vii].
A polinização é um processo fundamental para a agricultura, pois muitas espécies agrícolas dependem da polinização para se desenvolverem. Estudos estimam que 10% do valor econômico de alguns produtos é advindo da polinização [viii]. Por outro lado, mais de 80% das espécies botânicas necessitam de polinização para sobreviverem [ix], o que significa um valor inestimável para o ecossistema.
A ação do homem sobre o meio ambiente tem modificado sensivelmente as relações entre aves e matas, tanto pela destruição do habitat como pela escassez de alimentos, determinando a redução, ou mesmo, a extinção de algumas espécies. Por mais que a legislação tente proteger flora e fauna, as medidas tornam-se ineficientes em decorrência da falta de recursos e da cultura popular que não atribui ao equilíbrio ecológico a própria sobrevivência.
No mundo, estima-se que haja em torno de 10.000 espécies de aves, destas o Brasil possui cerca de 1.900 espécies, sendo 166 consideradas como "globalmente ameaçadas de extinção". As aves são eficientes indicadores da qualidade de vida de um sistema ecológico porque são bastante estudas, são frequentes e com hábitos regulares o que permite monitoramento confiável. Apenas como exemplo, pode-se citar o caso da araponga ((Procnias nudicollis) que só ocorre em florestas muito bem preservadas. Os pardais (Passer domesticus) e as pombas (Columba livia) são aves que só ocorrem em ambiente urbano.
Assim como há aves que só ocorrem em ambiente urbano, há as que só ocorrem em matas, como a choca da mata (Thamnophilus caerulescens). Por outro lado, há aves que transitam de um ambiente para outro como a arara Canindé (Ara ararauna). Esta complexidade de hábitos das aves demanda práticas protetoras diversificadas. Em termos de projetos de proteção das araras há diversos esforços, principalmente, na área privada. Como exemplos, pode-se citar: Ararinha na natureza [x]; Instituto arara azul [xi]; Projeto Re-Habitar Ararinha Azul [xii].
As aves sofrem agressões através de diversas práticas predatórias. Relatório do ICBio [xiii], aponta que em torno de 11,9% das espécies de aves encontram-se em processo de extinção, ou seja, 236 espécies. O bioma Pampa apresenta 16 espécies ameaçadas de extinção [xiv], conforme pesquisa da Fundação Zoobotânica/RS [xv].
Competências
Competências é matéria constitucional ( CF/88, artigos 21 a 24), derivadas dos preceitos expostos no artigo 18 da CF/88 que define a repartição administrativa e atribui-lhes funções específicas, evitando conflitos e proporcionando efetividade da legislação. Assim a CF/88 aponta o caminho para a proteção do meio ambiente em termos de práticas de gestão.
Em relação à divisão das competências, a doutrina consagra uma terminologia que já se tornou tradicional: competência legislativa privativa da União, competência legislativa dos Estados-membros, competência legislativa concorrente e competência legislativa dos Municípios. Esta divisão define as áreas de atuação das competências, restando esclarecimento sobre a forma de exercício delas.
Esta repartição de competências pode, também, ocasionar ineficiências ou mesmo disputas entre os entes administrativos, pois sobre um mesmo território e população podem ocorrer ações que causem conflitos entre as competências. No intuito de evitar tais disputas, elas são classificadas em competências: exclusivas, privativas, comuns, concorrentes e suplementares.
Esta divisão de competências vale para todos os setores, mas, no caso do Direito Ambiental, surgem algumas particularidades. Em matéria ambiental, relativa à flora e à fauna, o espaço territorial não pode ser limitante, pois nem plantas ou animais obedecem aos limites territoriais.
Até o advento do Sistema Nacional das Unidades de Conservação (SNUC), as unidades estavam sujeitas às instabilidades jurídicas, pois não havia definições claras das competências para suas criações e manejo. No sentido de normatizar estas ações, o SNUC define as unidades em todas as esferas: federal, estadual ou municipal e, com isto, oferece a base legal para a preservação dos biomas brasileiros [xvi] 19. A diversidade de biomas nos eleva à condição de país de maior diversidade do mundo.
Cada bioma tem seu conjunto característico de flora e fauna, possibilitando estabelecer um mapa de ocorrência de aves e plantas endêmicas e nativas. A preservação destes refúgios torna-se complexa tanto pela interdependência, como pela dificuldade de saneamento de processos destrutivos em cada local. A natureza é dinâmica e, um evento numa determinada região, pode ocasionar danos em regiões distantes e não conhecidas o que pode causar consequências irreparáveis, tornando difícil a efetividade da aplicação da legislação.
Visando propiciar efetividade na aplicação da legislação, o sistema jurídico estabelece competências, que limitam as áreas de atuação dos entes administrativos quanto à natureza e à extensão.
Quanto à natureza, temos as competências federais, estaduais e municipais, cada uma com autonomia de atuação que, por sua vez, podem ser de natureza administrativa ou legislativa. A competência administrativa exerce poder de gerenciamento e fiscalização dos espaços a serem preservados, incluindo o poder de polícia, enquanto a competência legislativa tem função de elaboração de instrumentos legais para estabelecer ações e procedimentos. O funcionamento de tais competências é que proporciona a efetiva aplicação do Direito Ambiental.
Em termos de extensão, a Constituição Federal (art. 21) classifica as competências em exclusivas, privativas, comuns, concorrentes ou suplementares. Esta classificação institui os princípios de hierarquia e complementariedade A diferença se faz sentir ao comparar o artigo 21 com o 22. No primeiro a competência da União é exclusiva e indelegável, enquanto as funções do artigo seguinte são privativas, mas delegáveis através de lei complementar.
O artigo 30, inciso I da CF/88 estabelece as competências municipais para legislar sobre meio ambiente nos assuntos que forem de interesse local. O princípio vigente é que, além de não poder ser conflitante com legislação estadual ou federal, deve ser derivada de legislação complementar concorrente.
O sentido do termo "local" ( CF/88, artigo 30, I), no caso da legislação municipal, pode gerar conflitos, pois é amplo e não define com exatidão a natureza dos interesses incluídos. Esta imprecisão poderia gerar falta de efetividade na aplicação da lei.
Na própria Constituição Federal/88, art. 182, fica estabelecida a competência dos municípios para a adoção de Planos de Diretrizes Municipais que versem sobre a ocupação da cidade com regras claras, estabelecendo o que é permitido ou proibido nos limites do município, incluindo procedimentos de preservação ambiental. Tais planos, votados pelas Câmaras Municipais, tornam-se leis após sanção do prefeito.
Responsabilidades
A sociedade contemporânea é vigilante na defesa do meio ambiente como forma de proteção do bem maior que é vida com qualidade no seio da comunidade. Este desejo, um tanto difuso, tem levado à mudança de atitude em relação aos entes jurídicos, principalmente os de interferência na ordem econômica, pois o crescimento sustentável [xvii] tem-se sobreposto ao sentido de crescimento sustentado.
Os reclames da sociedade em direção à regulamentação das relações entre pessoa jurídica e a comunidade em que atua, têm descortinado ao mundo jurídico um novo campo de estudos e de aplicação, buscando cada vez mais a proteção de direitos, tradicionalmente incluídos entre os de terceira dimensão, que constituem um bem jurídico a ser tutelado.
O conceito de meio ambiente, muito utilizado na área de ecologia, ainda permanece com algumas oscilações no campo jurídico. Tal conceito é positivado pela lei nº 6938/81 em seu artigo terceiro I, definindo entre outros termos: "I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas";
Extravasando os limites da ciência jurídica, é possível evidenciar a importância do meio ambiente como um patrimônio público e atemporal, pois além de ser algo de uso coletivo, é também um elo entre gerações, pois sua preservação é segurança para as gerações futuras. Esta concepção leva à perspectiva de um direito mais amplo do que a relação entre a comunidade e a pessoa jurídica, projetando-se no tempo. Este conceito é muito importante para a avaliação da reparação de danos.
Através deste diploma legal temos a configuração jurídica do conceito de "meio ambiente", bem como as possíveis formas de transgressão. Este conceito se consolida com a determinação da Constituição Federal de 1988 que torna claro o compromisso social das pessoas jurídicas em relação ao meio ambiente, determinando o procedimento penal no caso de transgressão. Art. 225, § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Estes dois diplomas legais são ilustrativos do esforço do legislador no sentido de proteger este direito difuso da sociedade e, ao mesmo tempo, estabelecer a função do Direito diante do desrespeito pelo bem comum, não distinguindo entre entidade pública ou privada quanto à obrigação de reparação dos danos e das penalidades.
Depois deste exame do conceito de meio ambiente e da responsabilização das pessoas físicas, jurídicas, privadas ou públicas, restam discussões acaloradas tanto quanto à extensão do conceito, quanto às formas de execução da responsabilidade pelos danos causados.
Com uma visão mais ampla, estudiosos contemporâneos alcançam o patrimônio histórico, arqueológico e paisagístico como elementos pertencentes ao âmbito do meio ambiente. Com esta postura, a preservação do meio ambiente engloba um conjunto de bens materiais e imateriais que, ao lado dos componentes biológicos, químicos e físicos, constituem um conjunto de valores a serem protegidos e defendidos, em razão do bem-estar da sociedade, da memória cultural e da segurança do futuro. Roger Scruton, em rápidas palavras demonstra a passagem de uma visão positivista do status dos animais para uma visão moral:
"Animais já foram considerados coisas, colocados na terra para nosso uso e gozo, para ser tratado de acordo com a nossa conveniência. Isto não é mais assim. Todas as pessoas que agora pensam reconhecem o abismo que existe entre seres sencientes e não-sencientes e quase todos reconhecem que não temos o direito dado por Deus de ignorar o sofrimento que causamos, só porque a vítima pertence a algumas outras espécies". (SCRUTON: 2000, p. 7)
Diante da complexidade deste conceito, é natural que a eficácia dos instrumentos jurídicos, a extensão da responsabilização, bem como a efetividade da aplicação da lei têm consumido o esforço de juristas e pensadores sobre a melhor forma para preservar a lucratividade, manter a sustentabilidade e permitir o desenvolvimento das empresas nacionais, levando-as ao patamar da competitividade no âmbito internacional. Há também que se avaliar a urgência de medidas que possam antecipar e evitar danos, muitas vezes irreparáveis para a sociedade.
Focar a atenção no meio ambiente, não é só adoção de medidas reguladoras ou saneadoras, mas desenvolver estudos e projetos que preservem este patrimônio de todos e adotem medidas que previnam danos futuros. Esta é uma postura que diferencia a proteção do meio ambiente de outras formas de tutela jurídica, pois aqui não lidamos apenas com a restauração de um dano passado ou com a iminência de um dano no presente, mas acima de tudo é obrigação a previsibilidade de ocorrências nefastas ao bem coletivo. O meio ambiente não é um patrimônio da geração presente, mas uma herança das anteriores e um legado às vindouras.
Concluindo este pensamento, resta reafirmar o quanto o meio ambiente é um bem jurídico a ser tutelado pelo Estado e, com isto, poder estabelecer o tipo penal pertinente, como decorrente da extensão da agressão perpetrada. A Lei dos crimes ambientais (Lei 9.605/98) visa a tutela do bem ambiental, prevendo caráter repressivo nas ações penais de forma a assegurar um sistema equilibrado, termos ecológicos, para as gerações presente e futuras.
As posições divergentes e, em certos casos, até opostas, como ocorre entre a responsabilidade civil objetiva, adotada pela legislação pátria e a responsabilidade civil subjetiva que poderia levar a uma situação de impunidade do poluidor. Este impasse fica solucionado pelo artigo 14, parágrafo 1º da Lei 6.938/81 que consagra a responsabilidade objetiva em casos de dano ambiental, determinando a reparação e indenização.
A possibilidade de conflito com o Código Civil anterior que exigia culpa e dolo, fica sanada pelo novo código Civil que em seu artigo 927, parágrafo único [xviii] que exige a reparação do dano de acordo com o entendimento de responsabilidade presente nos artigos 186 e 187 do mesmo instrumento legal.
As luzes que os teóricos lançam sobre o tema são fundamentais para que o legislador consiga estabelecer a tipificação civil, penal ou administrativa bem como a definição das responsabilidades. Sob a orientação da teoria é que a prática se fundamenta.
Responsabilidade civil
A humanidade sempre enfrentou a luta entre o interesse coletivo e o individual e, ao longo do tempo, foi firmando sua opção pela adoção de medidas de proteção aos bens coletivos. O século XIX transcorreu com a convicção de que os entes coletivos não são passíveis de penalização – "Societas delinquere non potest" [xix].
O século XX toma outro direcionamento após a Primeira Grande Guerra. Os Estados assumem posição de controle e punição de grupos econômicos que não estejam sob a diretriz estatal. A iniciativa privada, para fugir do controle, inicia a formação de oligopólios que passam a enfrentar a ação dos Estados. A Segunda Guerra Mundial revelou a promíscua relação entre empresas e Estado, tendo por objetivos o crescimento econômico e o domínio político.
Finda a Segunda Guerra Mundial, os Estados democráticos e os pensadores da área jurídica buscam caminhos que preservem os direitos individuais e, ao mesmo tempo, protejam a coletividade. Assim, apesar de divergências superadas, quanto à legitimidade e o modo de responsabilização civil e penal dos destruidores do equilíbrio ecológico, fica a questão solucionada, pois algumas objeções à responsabilidade penal, como esclarece Luís Paulo Sirvinskas, seriam decorrentes do pressuposto da impossibilidade de penalizar com a pessoa jurídica em relação às penas "restritivas de direito", bem com relação à dosimetria da pena. Como alerta o mesmo autor, estas questões ficam resolvidas pelo sentido estrito do artigo 225 da CF/88. (SIRVINSKAS: 1998, p. 21).
Organismos internacionais passam a buscar regras para o controle das organizações privadas, especialmente em relação à proteção ao meio ambiente no âmbito internacional. Até meados do século XX, a degradação do meio ambiente era vista como um ônus a ser pago pelo progresso, mas a poluição ambiental leva os governos à Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, Estocolmo, 1972. Surge deste evento a consciência de que os países têm obrigação de proteger o meio ambiente, não só por suas comunidades, mas também pelo impacto causado no Planeta.
Surge desta conferência o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a consequente resolução do Banco Mundial (BIRD) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), exigindo projetos de sustentabilidade para liberação de financiamentos. Talvez esta medida de caráter econômico tenha motivado empresas e países a estabelecer controles mais rígidos para que possam buscar desenvolvimento e competitividade.
O equilíbrio entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade é o foco da reunião da ONU/2015 que traça os dezessete objetivos de desenvolvimento sustentável a serem atingidos até 2030. O objetivo 15 é referente ao meio ambiente ao expressar o sentido de: "Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade. " [xx]
As empresas privadas não são mais vistas, apenas, como instituições geradoras de lucro, pois o princípio da "função social" determina uma nova visão sobre elas, o que se encontra disciplinado em diversas passagens na Constituição Federal/88 e em outros dispositivos legais [xxi].
Responsabilidade penal
São importantes algumas considerações sobre a responsabilidade penal de pessoa jurídica, percorrendo o caminho histórico deste conceito e, ao mesmo tempo, apreciando a situação em alguns países que servem como modelo ou estudo para a posição mais frequente no ordenamento jurídico pátrio. Percebe-se não ser discussão superada, mas que já caminha na direção da penalização de empresas que abandonam as responsabilidades sociais para buscar lucro maior. Importante, também, a apreciação de algumas decisões das cortes nacionais, às vezes conflitantes, em direção à solidificação de princípios e regras para a responsabilização de pessoa jurídica. Privada ou pública, a pessoa jurídica extrapola os limites de sua individualidade para tornar-se um ente profundamente comprometido com as relações sociais.
A partir da década de setenta, diversos congressos internacionais de Direito Penal orientaram no sentido de penalização das condutas delitivas ao meio ambiente, sendo que em 1994 o XV Congresso Internacional de Direito Penal, no Rio de Janeiro, aprovou algumas recomendações que são fundamentais para o reconhecimento da necessidade de penalização da pessoa jurídica que viola as regras de boas práticas de manejo do meio ambiente.
Doutrinadores como Luís Paulo Sirvinskas (1998) e Édis Milaré (2013) apontam três posicionamentos distintos quanto à responsabilidade penal da pessoa jurídica: a) O grupo de pensadores que seguem as experiências inglesa e norte-americana (Common Law) que reconhecem plenamente a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Esta postura tem sido adotada por muitos outros países, mesmo com tradição, ligados a Civil Law; b). Um outro conjunto de doutrinadores entendem não ser possível a penalização da pessoa jurídica. c) O terceiro grupo toma posição intermediária, estabelecendo punições administrativas como multas e indenizações, mas restringindo-se ao campo administrativo.
A Constituição de 1988, através dos artigos 173, § 5º e 225 § 3º consagra a doutrina de aplicação do Direito Penal à pessoa jurídica. Mesmo doutrinadores contrários a este princípio admitem a determinação inequívoca da Carta Magna. Assim, no Brasil, a doutrina deixa de discutir a validade do ensinamento constitucional e passa a oferecer argumentos em torno de sua exequibilidade ou não.
Embora a clareza do texto constitucional, o assunto não tem sido tratado com passividade pelos tribunais e por alguns doutrinadores que continuam levantando polêmicas quanto à aplicação em casos concretos. Muitas vezes, o conflito entre interesse privado e bem-estar social pode levar a posturas com aparente contradição.
Consoante ao previsto na Constituição de 1988 (Art. 225, § 3º) e na Lei de Crimes Ambientais 9.605/98 que autoriza a aplicação do Direito Penal para crimes cometidos por pessoa jurídica, podemos passar ao exame dos procedimentos para tal execução.
O Direito Penal se rege pelo princípio da "Intervenção mínima" (ultima ratio), ou seja, legitima-se quando os demais ramos do direito se mostram precários para a solução do conflito. Bem explícita o artigo 225, § 3º da Constituição/88 ao definir que se aplicam "as sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. " A Carta Magna alcança o Direito Penal após as sanções de ordem administrativas e cíveis, portanto não é o início da lide, mas um passo a mais em direção ao restabelecimento da ordem social e de seu bem-estar. Por ser o último passo não significa carência de importância, pelo contrário, é o fechamento de uma ação reparadora.
À luz do Direito Constitucional - CF, art. 5º, XLV – o Direito Penal assume dois princípios básicos que se tornam importantes para o exame do que nos propomos: Culpabilidade e Individualização das penas. Não se concebe culpa sem que se comprove a participação do agente, assim como a ação penal não pode ultrapassar a pessoa do transgressor.
No Direito Penal, em relação à pessoa jurídica, não se admite a responsabilidade objetiva como ocorre no Direito Civil, portanto aqui conta como fundamental a presença do agente. Pessoa jurídica e seus agentes estão enquadrados como passíveis de penalidades tanto pelo que descrevem os art. 173, § 5º e 225 § 3º da Constituição Federal/88, como pela legislação infraconstitucional, lei de Crimes Ambientais 9.605/98, art. 6º. A regra geral da culpabilidade tem uma certa inflexão quando se refere à pessoa jurídica.
A responsabilização da pessoa jurídica não exclui as pessoas físicas envolvidas como sócias ou dirigentes. Neste ponto a legislação adotou o sistema de dupla imputação e avança no tema ao estabelecer a possibilidade de desconsideração da pessoa jurídica, alcançando o patrimônio das pessoas físicas envolvidas. O objetivo é claro no sentido de proteção do meio ambiente, punindo com severidade as transgressões à lei, como explicita o artigo 4º da lei 9.605/98: "Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente."
Conforme artigo 6º da lei 9.605/88, três são as penalidades aplicáveis: multa, restritivas de direito e prestação de serviços à comunidade, ainda, segundo o mesmo texto legal, há três critérios para a aplicação da pena [xxii].
O primeiro critério refere-se à gravidade da ação delitiva, levando-se em conta o grau de lesão e a extensão da responsabilidade. São dois critérios independentes, pois, um fato pode ser grave, mas resultado de uma intenção menos culposa, por outro lado, um dano menor pode ser causado por uma culpa máxima do agente. No primeiro caso não se pode deixar de invocar a responsabilidade do agente e sua obrigação de reparação. O segundo caso é exemplar de pequenas consequências, mas oriundas de irresponsabilidades fragrantes o que exige punição adequada à prevenção de novos danos, talvez mais graves.
O segundo critério refere-se ao próprio infrator. Não há como deixar de distinguir o contumaz infrator que, ao longo do tempo, demonstra desrespeito pela legislação, em confronto com agente que, por razão furtiva, produz dano ao meio ambiente. Mais uma vez o legislador está atento à função primordial de priorizar a prevenção e restabelecer o convívio harmonioso entre desenvolvimento e sustentabilidade. A função penal não tem como finalidade a punição, mas a convivência harmônica entre os entes sociais, por tal a razão a prevenção e o acompanhamento (fiscalização) são fatores fundamentais na proteção do meio ambiente. Não tem sentido a criação de leis punitivas sem mecanismos de controle e orientação das atividades econômicas, por isso ao Estado, antes de tudo, cabe a responsabilidade pela orientação e fiscalização das pessoas jurídicas.
O terceiro critério diz respeito à situação econômica do infrator, conforme o artigo supracitado, pois este é um fator importante para contribuir para a efetividade da aplicação da lei. Aplicar pena pecuniária além das posses do infrator, com certeza, será ineficiente, pois, não tendo recursos suficientes, não pagará a multa e continuará na mesma situação delitiva. Por outro lado, aplicar valor muito baixo, permitirá o pagamento sem esforço e, não tendo efeito sobre o patrimônio, manterá a prática criminosa. Por esta razão, deve-se recorrer ao art. 59, caput do Código Penal [xxiii] como fonte subsidiária.
O critério de proporcionalidade entre capacidade econômica da empresa e o montante da multa é o fator determinante para a aplicação da pena, pois permite estabelecer um parâmetro para a fixação de valores, bem como a avaliação do quanto a empresa obteve de vantagens ilícitas. Embora seja um critério útil, ele se torna impreciso diante da dificuldade de avaliar o quanto do lucro da empresa é oriundo do ato delitivo.
Qualquer valor arrecadado, com multas provenientes de crimes contra o meio ambiente, deve ser encaminhado ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, conforme Lei 7.797/89 [xxiv]. O espírito da lei é obrigar o poder público a aplicar os valores arrecadados em benefício da própria natureza.
O segundo grupo de penas aplicáveis às pessoas jurídicas é regido pelo artigo 22 da lei 9.605/98. Neste dispositivo há que se fazer considerações importantes sobre a distinção entre pessoa jurídica de direito privado e pessoas jurídica de direito público. O texto em si não traz indicativo das impropriedades que podem surgir devido a sua aplicação de forma indistinta. Por serem penas restritivas adquirem caráter de interdição o que acarretaria a paralisação do órgão público, em detrimento de outros bens também protegidos.
Os incisos I e II, do referido artigo, referem-se à suspensão parcial ou total das atividades ou a interdição da empresa infratora. Os parágrafos § 1 e § 2 estabelecem a distinção entre suspensão e interdição. O primeiro aplica-se nos casos de funcionamento irregular, cessando o efeito no momento da adequação da prática. O segundo caso refere-se à falta de habilitação legal para funcionamento ou ao desvio da atividade prevista.
Tratando-se de pessoa jurídica de direito privado, é pacífica a compreensão dos referidos incisos, mas quando as infrações ocorrem no âmbito público as discussões são bem acentuadas, pois é difícil a compreensão da suspenção ou interdição de ente público, dado o seu caráter social. Uma discussão importante refere-se à previsão legal, pois alguns autores defendem que, no caso da pessoa jurídica pública, a previsão deverá ser específica e não genérica.
O inciso III estabelece restrições de relações da empresa, pois a infratora fica proibida de contratar com entes públicos, bem como receber subsídios, estabelecendo o prazo máximo de dez anos.
A última penalidade descrita no artigo 6º da lei 9.605/98 refere-se à prestação de serviços comunitários. Este preceito cumpre-se através de diversas formas de ação em benefício da comunidade, como adoção de espaços públicos, subvenção de projetos ambientais ou execução de obras de interesse comunitário, regulados pelo artigo 23 da supracitada lei. Esta parece ser a solução mais simples e simpática à população, pois o benefício é conferido diretamente pelo cidadão.
Também de caráter material é o tema da prescrição dos delitos ambientais. É de tal monta o interesse público e o zelo dos operadores do Direito que tais eventos se classificam como imprescritíveis, como registra o STJ, através do Recurso Especial – REsp 1120117 AC 2009/0074033-7 (STJ): O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
A estes fatores de ordem material, acrescente-se outros de ordem processual. A pessoa jurídica pública é representada pelo titular do poder, eleito ou designado. Dada a transitoriedade dos ocupantes dos cargos, algumas dificuldades surgem, como quem chamar ao processo: o titular na época dos fatos ou o em exercício no momento da ação.
As três modalidades de penas podem ser aplicadas de forma isolada, alternativas ou concomitantes, tudo depende do resultado do processo. A gravidade da infração penal é que determina a punição.
É um direito de todos poder desfrutar de ambiente sadio e partilhar equipamentos coletivos essenciais, pois, para assegurar tal direito, é função do Estado a efetiva proteção do meio-ambiente. As relações sociais devem estar reguladas de tal forma que todo ente, privado ou público, possa ser responsabilizado pelos danos causados ao conjunto da sociedade.
Levando em conta que os maiores poluidores do meio ambiente são as indústrias, é imperioso que a legislação contemple instrumentos capazes não só de punir, mas prevenir e regulamentar a atividade econômica. O lucro empresarial é fundamental tanto para a saúde da empresa, quanto para a própria comunidade que se beneficia dos empregos e investimentos proporcionados. O que deve ser punida é a obtenção de ganhos ilícitos através de ações fraudulentas que põem em risco a saúde e bem-estar da população. Este é um tema de grande relevância para o Direito e para todos os que lutam por melhores dias dentro de uma sociedade mais justa e harmoniosa.
Efetividade da tutela ambiental
Para falar em efetividade da tutela ambiental, é necessário que se coloque como parâmetro o texto constitucional que em seu artigo 225 que prevê o meio ambiente como um bem inerente a todos e à responsabilidade do poder público e à coletividade em assegurar a preservação a fim de transmitir às futuras gerações uma vida saudável. No § 1º incumbe ao Ministério Público assegurar a efetividade do direito "ao meio ambiente ecologicamente equilibrado…"
Dentre as atividades previstas no artigo 225 da CF/88, cabe ao MP: a) II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País; b) III – definir áreas de proteção; IV – exigir estudo prévio para atividades potencialmente poluidoras; VIII – proteger a flora e a fauna. Com estas prerrogativas fica clara a competência do MP para mover ações que visem preservar o ecossistema. Assim, percebe-se que o MP tem papel fundamental na promoção de ações para proteção do meio ambiente.
Porém, esta função primordial do MP não pode ser considerada como suficiente ou absoluta. O meio ambiente necessita do esforço de outros órgãos públicos, bem como da consciência da população. Há que se reconhecer que os órgãos responsáveis pela preservação ambiental, nem sempre estão aparelhados com recursos humanos e materiais para que possam desenvolver trabalho efetivo. Esta carência é recorrente em todas as esferas, federal, estadual e municipal.
Diante de tanta falta de recursos, não há como imaginar fiscalização eficiente e celeridade nos trâmites burocráticos na esfera administrativa. Por outro lado, a demora nos trâmites processuais torna a punição insuficiente para debelar o dano e tornar a punição do ato delitivo elemento desencorajador para novas agressões ao meio ambiente.
A discussão sobre a fauna, em especial sobre as aves, implica a necessidade de esclarecimento de alguns aspectos teóricos que, por sua vez, estabelecem a base para a efetiva proteção do meio ambiente. Uma primeira classificação que precisa estudo são os conceitos de fauna silvestre, doméstica e exótica (Art. 2º da Portaria Ibama nº 93 / 1998), pois os limites nem sempre são tão evidentes.
A lei nº 5.197/67, conhecida como Código de caça, conceitua a fauna silvestre em seu artigo 1º. Do texto legal, percebe-se dois princípios básicos: a territoriedade (vida silvestre) e a propriedade (são propriedade do Estado) da fauna silvestre. Estão nestas condições os animais que vivem livres na natureza e pertencem ao Estado, portanto não se pode falar em propriedade de animais silvestres, no máximo é possível referir-se como posse ou guarda.
Por seu turno, fauna doméstica é a que foi introduzida no ambiente doméstico, ao longo do tempo, adquirindo hábitos de convívio humano, alterando regime alimentar e passando a viver em dependência de algum protetor humano. O que se precisa reconhecer é que, nem sempre esta classificação é pertinente, pois não são raros os casos em que aves são domesticadas, aprisionadas, vivendo sob a dependência de algum humano.
Espécies exóticas são as que não pertencem ao espaço territorial nacional, mas foram introduzidas pela ação do homem ou por expansão territorial própria. Quando uma espécie exótica passa a competir com as silvestres ou domésticas, classifica-se como invasoras, pois causam prejuízo ao meio ambiente. Em alguns casos, estas aves exóticas passam a conviver com as locais de forma pacífica, não causando dano ambiental.
A ação do homem, quando altera estas disposições, desorganiza o meio ambiente e produz danos, muitas vezes irreparáveis quer pela extinção de espécies, via competitividade, quer pela alteração de hábitos, como modos de reprodução, alimentação ou defesa. Estas novas relações entre homem e fauna exigem respostas da justiça que, nem sempre, encontra abrigo na legislação.
Como entender que uma ave silvestre, depois de aprisionada e treinada por longo tempo, possa ser devolvida à natureza sem que isto cause dano irreparável para o animal, (ou mesmo a sua destruição) pela inabilidade de defesa? Há que se distinguir o processo de domesticação, ocorrido ao longo do tempo, como no caso da passagem do lobo (Canis lúpus) para o cachorro doméstico (Canis lupus familiaris) das formas de aprisionamento em que o animal mantém muitas características originais.
De qualquer forma, a domesticação é um processo de prejuízo à biodiversidade, pois, não raro, a seleção natural é substituída por uma seleção artificial que busca adaptar a espécie aos interesses humanos. São abundantes os exemplos no mundo dos pets, no qual muitas características naturais são suprimidas e, por outro lado, desenvolvidas outras apenas com valor estético [xxvi].
O aprisionamento de aves é uma atividade frequente na sociedade. Excluindo o crime de tráfico, este costume tem finalidade recreativa, circulando um conceito falso de preservação. Felizmente, este hábito está em plena decadência, principalmente, como decorrência do esforço de especialistas e de clubes de observadores de aves.
Estudo de caso – Resp 1.797.175/SP
Muitos casos de aprisionamento têm surgido e o conflito tem chegado aos tribunais. Os julgamentos têm sido, em geral, favoráveis à manutenção da ave com seu cuidador. As decisões criaram algumas construções teóricas que buscam atender ao princípio da segurança e bem-estar do animal. Entre dezenas de decisões, destaca-se a do ilustre ministro do STJ Og Fernandes que na REsp 1.797.175/SP reconhece a guarda de animais silvestres.
A decisão do IBAMA determina a apreensão das aves, encaminhamento para um CRAS, além da aplicação de multa. O processo tem origem na 1ª Vara de São José dos Campos/SP, através de laudo de apreensão de dois papagaios do mangue (Amazona amazonica) e dois periquitos maracanã (Psittacara leucophthalma) que estavam com a Sr.ª Lúcia Helena dos Santos há mais de cinco anos. No Agravo de instrumento [xxvii], o desembargador Nery Júnior acolhe os argumentos de bons cuidados, tempo de aprisionamento e o bem-estar das aves no convívio doméstico. Em decorrência do tempo.
A terceira turma do TRF/3ª região emite acórdão favorável à manutenção das aves aos cuidados da agravada, acolhendo por unanimidade o voto do relator Desembargador Neery Júnior. Esta decisão origina o recurso especial ao STJ que tem como relator o ministro Og Fernandes [xxviii].
O voto do ministro tornou-se referência para decisões posteriores e criou jurisprudência, especialmente, pela clareza e pela fundamentação dos argumentos. Em artigo publicado no site Consultor Jurídico [xxix], os eminentes pesquisadores Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer atribuem à decisão as características de ser "pioneira e inédita".
Os argumentos acolhidos pelo ministro, em seu conjunto, formam uma convicção inovadora que revela a efetividade da aplicação da lei de forma inovadora e estritamente abrigada no artigo 225 da CF ao reconhecer a "dignidade e direitos aos animais não humanos e à Natureza" no seu voto.
Uma primeira lição exarada é o desconhecimento da expressão "ter em cativeiro" como crime ambiental, por não ser tipificação adequada. Com este argumento, afasta a pena de multa, aplicada pelo IBAMA (AIA nº 293764), pois não se enquadra no artigo 29 da lei 9.605/98 que trata dos crimes ambientais, conforme ensinam Paulo José da Costa Jr. E Fernando José da Costa em Direito Penal Ambiental [xxx]. A justificativa decorre do fato de, embora sejam silvestres, não estejam ameaçadas de extinção.
Em ação junto ao TRF4 [xxxi], o IBAMA aplicou a um aposentado, residente em Viamão, uma multa no valor de R$ 8.000,00 reais, valor que excede o disposto no artigo 6º, III da lei 9.605/98, por desconsiderar "a situação econômica do infrator, no caso de multa". Na mesma decisão, argumenta o magistrado que "as consequências não foram graves, não houve indícios de maus-tratos aos pássaros, nem de intuito comercial na conduta de manter pássaros silvestres em cativeiro sem a devida permissão, licença ou autorização do órgão ambiental competente".
Estas decisões e outras corroboram no sentido de construir doutrina e jurisprudência no sentido de tornar efetiva a proteção ao animal, respeitado seus direitos e dignidade conforme argumenta o ministro Og Fernandes:
Neste contexto, deve-se refletir sobre o conceito kantiano, antropocêntrico e individualista da dignidade humana, ou seja, para incidir também em face dos animais não humanos, bem como de todas as formas de vida em geral, à luz da matriz jusfilosófica biocêntrica (ou ecocêntrica), capaz de reconhecer a teia da vida que permeia as relações entre ser humano e natureza. Inserido neste pensamento é que se faz premente a discussão, principalmente em relação aos animais não humanos, deve-se reformular o conceito de dignidade [xxxii].
Esta passagem do voto do ministro evidencia a aderência a um novo parâmetro em termos de conceituação da dignidade de animais não humanos já consagrado na obra Direito Constitucional e ambiental de Ingo Wolfganf Sarlet. [xxxiii]
No mesmo direcionamento, argumenta o mestre Tiago Fensterseifer, estendendo a concepção de dignidade aos animais como decorrência do próprio conceito de vida. Argumenta o autor:
Se a dignidade consiste em um valor que nós atribuímos à determinada manifestação existencial – no caso de dignidade humana, a nós mesmos – é possível o reconhecimento do valor "dignidade" como inerente a outras formas de vida não-humanas. A própria vida, de um modo geral, guarda consigo o elemento dignidade, ainda mais quando a dependência existencial entre espécies naturais é cada vez mais reiterada no âmbito científico ..." [xxxiv]
A própria vida, como elemento de dignidade, é a chave para a extensão deste princípio fundamental aos pássaros, como considera o ministro em seu voto. Seguindo o raciocínio, cabe a discussão sobre a questão da titularidade de direitos por parte dos animais e, como consequência, o status de sujeito de direitos, reconhecidos por um conjunto de legislação [xxxv] que conferem aos animais não humanos o direito à proteção e aos animais humanos, o dever de protegê-los.
A discussão que segue é relativa à titularidade de direitos por parte dos animais não humanos, pois para muitos, ainda presos ao Código Civil, art. 82, este status é negado a eles, pois classifica-os como "bens semoventes". Ao considerar o animal como um "bem" configura-se a concepção de pertencimento aos humanos, portanto dependente em termos de direitos. É em razão desta concepção que a doutrina contemporânea se insurge, atribuindo titularidade de direitos aos animais.
Transpostas as discussões sobre a evolução do conceito de titularidade de direitos por parte dos animais, é importante destacar o ensinamento da Defensora Pública Drª Vânia Nogueira.
Na fase atual os animais também são representados em juízos, mas, além do direito material, pleiteiam ainda o direito processual de serem reconhecidos como sujeito de direito e terem personalidade que possibilita aos mesmos demandarem em juízo em nome próprio. (NOGUEIRA, 2012, p. 311)
Esta marginalidade na atribuição de direitos aos animais torna-se um incentivo à sociedade para o desrespeito para com eles, como afirma a mesma autora em outra passagem da mesma obra.
Essa omissão legislativa em reconhecer um status diferenciado de coisa aos animais cria um sentimento de "tanto faz" na sociedade em relação ao modo de ver e lidar com os animais. O tratamento dispensado aos infratores que ofendem bens patrimoniais no direito brasileiro é mais rigoroso do que o tratamento dispensado a quem comete maus-tratos com os animais. (NOGUEIRA, 2012, p. 311)
O voto do relator atribui sentido de incongruência entre o disposto no Código Civil de 2002 e o artigo 225 da Constituição Federal, pois a Carta Magna estende o conceito de direitos aos animais. O autor, em seu voto, adverte para a necessidade de revisão da legislação infraconstitucional no sentido de respeitar o direito fundamental dos animais, como titulares em razão do próprio status de vida. Adverte em seu voto, o magistrado:
Portanto, faz-se necessária uma reflexão no campo interno das legislações infraconstitucionais, na tentativa de apontar caminhos para que se amadureça a discussão acerca do reconhecimento da dignidade aos animais não humanos, e, consequentemente, do reconhecimento dos direitos e da mudança da forma como as pessoas se relacionam entre si e com os demais seres vivos.
Este direcionamento reivindicado pelo ministro Og Fernandes já é consagrado pela Corte Interamericana, através da Opinião Consultiva OC-23/17 [xxxvi] que atribui personalidade jurídica aos entes naturais, tanto animais como rios, lagos e outros ambientes. Por outro lado, a Constituição Equatoriana traz em seu interior a determinação expressa de titularidade da Natureza em relação ao Direito, sendo considerada com capacidade de exigibilidade diante do Estado [xxxvii].
A decisão do ministro Og Fernandes torna-se um marco histórico na percepção de que a efetividade da proteção às aves não está na aplicação simples da lei, mas na construção de argumentos que, embasados em princípios maiores, são capazes de cumprir o espírito do texto legal da Constituição Federal/88 em seu artigo 225.
Conclusão
Não há como negar a evolução que a sociedade adquiriu nos últimos anos em termos de proteção ao meio ambiente. Se os problemas surgem em todas as direções, não há como deixar de reconhecer que a consciência ecológica está presente nas práticas sociais contemporâneas e na consciência dos cidadãos em geral. Se há um caminho longo a percorrer, há, também, avanços importantes.
Não estamos no final de uma jornada, mas no começo de uma grande vereda que, mais cedo ou mais tarde, há de chegar a um ponto de equilíbrio nas relações conflitantes entre o homem e o meio ambiente, bem como entre o desenvolvimento econômico e a preservação da natureza. Não é uma situação de conforto, mas de muita luta, cada batalha é uma parte da vitória final.
Em termos de aves, não há como deixar de lamentar a quantidade de espécies extintas ou ameaçadas de extinção, mas, quando se olha para projetos exitosos que com sacrifício tem impedido o desaparecimento de espécies, ou incentivado o desenvolvimento de tantas outras, percebe-se que muitos projetos, em especial da iniciativa privada, são uma esperança para um futuro melhor em termos de proteção às aves.
A consciência de heróis que lutam pela preservação de espécies não pode ser desconsiderada, pois este esforço bem representa a efetividade social que gera resultados positivos e, assim, propulsiona as mudanças no mundo jurídico. Preservar o meio ambiente não é apenas uma questão legal, mas depende muito mais da luta da sociedade e do engajamento de operadores do Direito.
A força motriz para a paixão pelas aves e a luta pela sua preservação, em parte, vem da contemplação destes seres especiais que a câmera fotográfica eterniza. Cada registro obtido é um troféu a comemorar e um motivo de reflexão sobre o futuro daquela espécie. O acervo de fotos depositado no Wikiaves [xxxviii] é o testemunho do esforço pessoal e um legado para gerações futuras. Cada viagem são dezenas de fotos que passam a compor o espaço pessoal para registros no site [xxxix].
O presente estudo não se encerra como uma brilhante pesquisa, mas como um ponto de reflexão que aponta para longe, evidenciando o quanto o tema é apaixonante e muito tem para oferecer ao pesquisador. A paixão pelas aves motivou o início deste trabalho e, ao final, evidenciou o grande desejo de perseverar neste caminho.
[i] MEDEIROS: 2004, p. 15
[ii] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: Uma Teoria Geral dos Direitos Fundamentais na Perspectiva Constitucional. Livraria do Advogado Editora Ltda.. Edição do Kindle. Posição 1170.
[iii] MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Direito dos Animais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 45.
[iv] Recurso Extraordinário nº 153.531/98.
[v] A palavra "oikós", originariamente grega, tem o sentido de lar, ambiente familiar, pertencimento ao conjunto dos elementos da comunidade.
[vi] BRASIL, Agência Nacional de Águas. Situação da água no mundo. Disponível em: https://www.ana.gov.br/panorama-das-aguas/agua-no-mundo . Acesso em maio/19
[vii] Como exemplos de polinizadores temos: as abelhas (Melitofilia); borboletas (Psicofilia); mariposas (Esfingofilia); moscas (Miofilia); besouros (Cantarofilia); morcegos (Quiropterofilia) . Esta classificação não tem função de aprofundar estudos na área de Biologia, mas evidenciar o quanto a relação entre animais e plantas é importante para o equilíbrio do meio ambiente.
[viii] BRASIL, MMA, Publicações.
[ix] https://www.semabelhasemalimento.com.br/home/polinizacao/ - Acesso em maio/19
[x] Projeto Ararinha na Natureza, preservação da Ararinha Azul - https://www.savebrasil.org.br/ararinha-na-natureza/ - Acesso em maio/19
[xi] Instituto Arara Azul - Mato Grosso - https://www.institutoararaazul.org.br/ - acesso em maio/19.
[xii] Projeto re-habitar - https://fade.org.br/projeto-re-habitar-ararinha-azul/
[xiii] Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção: Volume III – Aves
[xiv] Disponível em: https://www.fzb.rs.gov.br/upload/1396361250_lista_categoria.pdf - Acesso em maio/19.
[xv] A Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul foi oficialmente extinta em 2020.
[xvi] Os seis biomas continentais brasileiros são - Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa.
[xvii] Há que se distinguir "crescimento sustentado" que tem base econômica de "desenvolvimento sustentável" que amplia o conceito de crescimento, atingindo a esfera ambiental, seguindo os princípios divulgados pela Cúpula da Terra de 1992.
[xviii] Art. 927 7 do Código Civil l,parágrafo unicoo: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem."
[xix] Esta frase latina afirma que as sociedades não podem delinquir pelo fato de não haver vontade subjetiva no coletivo.
[xx] Fonte: https://nacoesunidas.org/conheca-os-novos-17-objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel-da-onu/amp/ - Acesso em maio/2019.
[xxi] Na CF/88 8 - Artigos,5ºº, XXIII; ;1700, III;1733,§ 1ºº, I;1822,§ 2ºº;1844,1855,parágrafo únicoo. No Código Civil art. 421 e no Direito Empresarial, art. 116, parágrafo único.
[xxii] Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III - a situação econômica do infrator, no caso de multa.
[xxiii]Código Penal l art. 59 9, caput: "O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime":
[xxiv] "Os recursos do Fundo Nacional de Meio Ambiente deverão ser aplicados através de órgãos públicos dos níveis federal, estadual e municipal ou de entidades privadas cujos objetivos estejam em consonância com os objetivos do Fundo Nacional de Meio Ambiente, desde que não possuam, as referidas entidades, fins lucrativos. "
[xxv] Art.1ºº da Lei5.977/67. "Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha."
[xxvi] Dentre os cães, o Buldogue inglês é um péssimo resultado; no mundo dos felinos, um caso lamentável são os gatos persas; nas aves em cativeiro surgem mutações como o diamante mandarim (Taeniopygia guttata). Para uma leitura sobre mutações genéticas, naturais ou não, em aves consulte: https://www.wikiaves.com.br/wiki/leucismo (acesso: 05/2019) os animais já não teriam condições de retornar ao ambiente natural, pois seus hábitos alimentares já haviam sido modificados, bem como estariam inaptos para defenderem-se de predadores.
[xxvii] Agravo de instrumento nº 0023893-15.2011.4.03.0000/SP
[xxviii] REsp 1.797.175/SP
[xxix] https://www.conjur.com.br
[xxx] MILARÉ, Édis et alii. Direito Penal ambiental. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, pags. 81-86.
[xxxi] Apelação Cível Nº 5077439-68.2015.4.04.7100
[xxxii] STJ - REsp: 1797175 SP 2018/0031230-0, Relator: Ministro OG FERNANDES,
[xxxiii] SARLET, Ingo Wolfganf.e FENSTERSEIFER, Tiago. Direito constitucional ambiental - 4. ed. - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014 (página 55)
[xxxiv] FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico constitucional do estado socioambiental de direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. (p. 47).
[xxxv] Pode-se citar: a) Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9.605⁄1998), b) Lei n. 7.173⁄1983, a qual disciplina o funcionamento dos zoológicos; c) Lei n. 7.643⁄1987, sobre proteção de cetáceos marinhos; d) Lei n. 11.794⁄2008, que regula as atividades científicas que envolvam os animais; e) Lei. n. 10.519⁄2002, que trata de normas de higiene e cuidados com os animais em rodeios e similares, além de uma série de leis estaduais e municipais.
[xxxvi] https://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_23_esp.pdf - Acesso em 05/19
[xxxvii]Constituição o Equatoriana, art.722: (.....) Toda pessoa, comunidade, povoado, ou nacionalidade poderá exigir da autoridade pública o cumprimento dos direitos da natureza. Para aplicar e interpretar estes direitos se observarão os princípios estabelecidos na Constituição no que for pertinente.
[xxxviii] "Wikiaves" é site de referência para observadores de aves no Brasil, não é um repositório de fotos, é um banco de dados de registros da avifauna brasileira. São mais de 48 mil observadores inscritos, com mais de 5 milhões de registros, num universo de mais de 1.900 espécies no Brasil.. Fonte: https://www.wikiaves.com.br/
[xxxix] Registros pessoais no site do Wikiaves: https://www.wikiaves.com.br/perfil_b387351ceacc958
Referências bibliográficas
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A efetividade da tutela ambiental da fauna/flora: pássaros